Art. 151, Inc. I a III - Seção II - Constituição Tributária Comentada

Art. 151. É vedado à União: I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do País; II - tributar a renda das obrigações da dívida pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como a remuneração e os proventos dos respectivos agentes públicos, em níveis superiores aos que fixar para suas obrigações e para seus agentes; III - instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. 1. Limites ao poder de tributar específicos à União. 1.1. Princípio da uniformidade geográfica. O art. 151 elenca vedações específicas ao poder de tributar da União, inaugurando o inc. I com a proibição da União instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional. A imposição tributária uniforme da União sobre todo território nacional significa a uniformidade da tributação federal sobre o território dos Estados, do DF e dos Municípios, de modo a preservar a igualdade das unidades federadas e, em última análise, fortalecer o próprio federalismo. Trata-se de mais um princípio jurídico-constitucional voltado para a realização da federação brasileira. 1.2. Princípio da vedação de tratamento diferenciado em relação aos entes federativos. Na prática, o princípio da uniformidade geográfica no âmbito do poder de tributar da União também se traduz com a proibição da União instituir tratamento tributário diferenciado em relação aos entes federativos. A regra geral pressupõe que a imposição tributária federal considere as mesmas regras tributárias impositivas, onde quer que elas incidam, sejam sobre o território do Estado do Rio Grande do Sul, sejam sobre o território do Município de Manaus. No entanto, o próprio inc. I do art. 151 prevê importante exceção, quando admite “a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do País”. Se, de um lado, eventual concessão de incentivos fiscais para a Zona Franca de Manaus, por exemplo, implica inequívoca tributação não uniforme sobre o território nacional, de outro lado este tratamento diferenciado (e desigual) encontra, como justificativa legítima, uma razão ou finalidade constitucional de maior envergadura, que é a redução das desigualdades regionais, um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 3º, inc. III, da CF). A concessão de incentivos fiscais para regiões como a da Zona Franca de Manaus foi uma das formas encontradas pelo Constituinte de tornar e manter essa região atrativa aos empreendedores, facilitando a instalação e a operação dos seus negócios e a urbanização, mesmo que em pequena escala, de uma área com condições climáticas desfavoráveis e com oferta precária de mão de obra. Vale ressaltar que os referidos incentivos devem ser voltados para a região como um todo. O objetivo da norma ancorada no dispositivo não é beneficiar determinadas pessoas, categorias ou setores. O legislador deverá sempre ter a cautela de conformar o incentivo, de modo que ele sirva efetivamente ao desenvolvimento socioeconômico da região, não beneficiando uma ou outra empresa em específico. O Poder Judiciário dificilmente poderá adentrar na análise de mérito da decisão legislativa de concessão do benefício, dada a jurisprudência pacífica do STF, segundo a qual a concessão de benefícios tributários é ato discricionário, fruto da articulação política entre o Executivo e o Legislativo, fundado em juízo de conveniência e oportunidade, não podendo o Judiciário atuar como legislador positivo, contemplando outras regiões ou contribuintes que ficaram de fora da concessão (ver aqui, dentre outros, o RE 344.331 , rel. Min. Ellen Gracie, 1ª Turma, j. 02.2003). 1.3. Tributação da renda das obrigações da dívida pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e da remuneração e dos proventos dos agentes públicos. De um lado, a União deve tributar a renda das obrigações da dívida pública dos Estados, do DF e dos Municípios, visto que os beneficiários dessa renda não estão protegidos pela imunidade tributária recíproca, bem como tributar a renda e os proventos dos seus servidores públicos, como uma decorrência da sua obrigação tributária impositiva. De outro lado, quando o fizer, não poderá fazê-lo em níveis superiores ou de modo mais gravoso ao que fixar para suas obrigações e para seus agentes. Caso contrário, estaria impondo tratamento tributário desigual entre os entes federativos, violando o princípio da uniformidade da tributação, sob o aspecto espacial, e o princípio da isonomia, sob o aspecto subjetivo, relativos às pessoas políticas. 1.4. Proibição de isenções heterônomas. O art. 151 veda à União “instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios”. A regra geral insculpida no inc. III coaduna-se com a noção de regra de competência tributária impositiva, segundo a qual a CF é quem prevê as regras que conferem o poder a cada pessoa política para instituir e cobrar os tributos, de forma privativa, concorrente, extraordinária ou residual. A competência tributária possui seu viés positivo na imposição tributária e seu viés negativo na desoneração tributária, de modo que o titular da competência a exerce tanto em um como em outro viés. Decorrência dessa lógica é a proibição trazida à União de estabelecer isenções de tributos que sejam da competência das outras pessoas políticas, de modo a evitar invasão de competência sob o viés negativo e interferir na discricionariedade dos outros entes da federação, o que resultaria também em violação ao pacto federativo. Há exceções pontuais com relação a essa vedação, dentre elas (i) as isenções previstas em lei complementar, relativas ao ICMS e ao ISS sobre as exportações de produtos e serviços (art. 155, § 2º, XII, e, e art. 156, § 3º, II, da CF) e (ii) as isenções instituídas pela União em sede de tratados internacionais, enquanto signatária e representante da República Federativa do Brasil. O STF entendeu legítima a concessão de isenção, pela União, de ICMS no Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), visto que, em sede de tratados internacionais, o Presidente da República não os celebra na condição de Chefe de Governo, mas de Chefe de Estado, afastando a caracterização como isenção heterônoma ( RE 229.096 , rel. Min. Ilmar Galvão, rel. p/ ac. Min. Cármen Lúcia, Pleno, j. 08.2007). Nesse caso, a autorização é válida para o âmbito das relações externas e não internas às unidades federadas. No âmbito das relações externas, o sujeito partícipe é a República Federativa do Brasil, como pessoa jurídica de Direito Internacional Público, a qual detém a devida soberania, inclusive para estabelecer isenções de tributos estaduais.

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