Capítulo 10. O Pedido

A instauração do processo nos Juizados Especiais Cíveis é deflagrada pela apresentação do pedido à Secretaria do Juizado (art. 14 da Lei nº 9.099/95). Em virtude do princípio da oralidade, a legislação faculta a apresentação por escrito 1 ou oralmente. Nesse último caso, ele será reduzido por escrito pela Secretaria do Juizado, podendo ser utilizado o sistema de fichas ou de formulários impressos (art. 14, § 3º, da Lei nº 9.099/95). 10.1.Requisitos da petição inicial (ou pedido) A petição inicial (denominação dada pelo Código de Processo Civil nos artigos 43, 59, 99, 127, 312 e 319) foi alcunhada pela Lei nº 9.099/95 simplesmente de pedido, expressão que doravante utilizaremos, embora a técnica empregada não tenha sido a melhor. Não se exigem maiores formalidades para a elaboração do pedido, levando grande parte da doutrina a afirmar que os requisitos do art. 319 do Código de Processo Civil não são de observância obrigatória O § 1º do art. 14 da Lei nº 9.099/95 elenca os elementos do pedido, que constarão de forma simples e de linguagem acessível. São eles: I – O nome, a qualificação e o endereço das partes. São informações primordiais para a constituição e desenvolvimento do processo. É preciso saber quem litiga, contra quem se litiga, e os respectivos endereços, para viabilizar a prática de determinados atos processuais. II – Os fatos e os fundamentos, de forma sucinta. O Código de Processo Civil exige a exposição dos fatos e dos fundamentos jurídicos (art. 319, III). A expressão não reproduzida no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, do que se infere a desnecessidade de citação de artigos de lei. III – O objeto e seu valor. O objeto aqui tratado é sinônimo de pedido, ou seja, é o próprio bem da vida pretendido pelo autor. A título de exemplo, o pedido para condenar o réu a pagar indenização por danos materiais ou morais, o pedido para rescindir determinado contrato ou o pedido para condenar o réu a uma obrigação de fazer. Por valor, leia-se valor da causa, que funciona como critério de competência. De acordo com o Enunciado 39 do FONAJE: “Em observância ao art. 2º da Lei 9.099/1995, o valor da causa corresponderá à pretensão econômica objeto do pedido”. As demandas ajuizadas sem o patrocínio de advogado exigem um abrandamento ainda maior do rigor formal da petição inicial. 10.2.A intepretação do pedido Ao Juiz cabe extrair do conjunto da narrativa dos fatos a verdadeira intenção da parte ao ingressar com a ação judicial, o que não significa, a toda evidência, a possibilidade de prolatar uma sentença extra ou ultra petita. Em boa hora, o art. 322, § 2º, do Código de Processo Civil, estabeleceu que a interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé, incorporando o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça: “Assente na jurisprudência desta Corte o entendimento de que o pedido deve ser compreendido a partir da interpretação lógico-sistemática de todo o conjunto de razões apresentadas, não se devendo ficar adstrito ao que consta no capítulo específico da petição.” 2 Nesse contexto, “se a demanda abrange toda relação contratual, o julgador pode extrair do contrato o verdadeiro alcance de suas cláusulas, dirimindo as dúvidas que surgirem, sem que isso configure ofensa aos arts. 2º, 128 e 460 do CPC/73”. 3 Noutra oportunidade, o STJ assentou que: “[...] a despeito da falta de clareza quanto à definição da real natureza do pedido formulado pela parte autora (se indenizatório, de arbitramento ou de cobrança de honorários sucumbenciais), resulta evidente que a petição inicial veiculou pretensão indenizatória equivalente aos honorários sucumbenciais, que não se confunde com os honorários sucumbenciais propriamente ditos.” 4 Em ação que se buscava o cancelamento de registro imobiliário, o pedido inicial foi julgado procedente na origem para rescindir a escritura pública de compra e venda quando o pedido se limitava ao compromisso particular de compra e venda. Debruçando-se sobre a questão, o Superior Tribunal de Justiça considerou que o inadimplemento de duas das três parcelas da compra e venda celebrada pelas partes permitiu a conclusão de que havia pedido, implícito, de rescisão do contrato e cancelamento do registro imobiliário, tendo como consequência lógica a rescisão da escritura pública. 5 Os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios, 6 integram o pedido principal, ainda que não postulados expressamente pelo autor (art. 322, § 1º, do Código de Processo Civil). 10.3.Pedido genérico e cumulação de pedidos O pedido genérico é possível quando não se puder determinar, desde logo, a extensão da obrigação. Mesmo nesse caso a sentença será sempre líquida ( parágrafo único do art. 38 da Lei nº 9.099/95). O FONAJE tem Enunciado no sentido de que “No Sistema dos Juizados Especiais, não se aplica o disposto no inc. V do art. 292 do CPC/2015 especificamente quanto ao pedido de dano moral; caso o autor opte por atribuir um valor específico, este deverá ser computado conjuntamente com o valor da pretensão do dano material para efeito de alçada e pagamento de custas” (Enunciado 170 - XLI Encontro - Porto Velho-RO). A formulação de pedidos alternativos ou cumulados também é permitida pela lei, desde que, nesse último caso, sejam conexos e a soma não ultrapasse o limite de quarenta salários mínimos. Percebe-se, nesse particular, que a cumulação de pedidos no rito sumaríssimo é mais restrita que aquela prevista no art. 327, § 1º, do Código de Processo Civil. 7 Dessa forma, por exemplo, não é possível cumular um pedido de indenização com base em responsabilidade contratual com outro, fundamentado em responsabilidade extracontratual, se derivarem de fatos diversos. 8 Embora ausente no texto da Lei nº 9.099/95, o pedido subsidiário (ou sucessivo), previsto no art. 326 9 do Código de Processo Civil, é compatível com o rito sumaríssimo. É possível a formulação de pedido de desconsideração da personalidade jurídica na petição inicial, por força do art. 1.062 do Código de Processo Civil. 10 O rito seguirá o disposto nos artigos 133 a 137 do CPC. Registrado o pedido, independentemente de distribuição e autuação, a Secretaria do Juizado designará a sessão de conciliação, a realizar-se no prazo de quinze dias. Não é necessário prévio despacho judicial para a prática do ato, que poderá ser praticado diretamente pela Serventia. Comparecendo inicialmente ambas as partes, instaurar-se-á, desde logo, a sessão de conciliação, dispensados o registro prévio de pedido e a citação. Havendo pedidos contrapostos, poderá ser dispensada a contestação formal e ambos serão apreciados na mesma sentença. O aditamento do pedido é permitido até o momento da audiência de instrução e julgamento, ou até a fase instrutória, resguardado ao réu o respectivo direito de defesa (Enunciado 157 do FONAJE). Não raro, o Juiz somente tomará ciência da petição inicial na audiência de instrução, momento em que deverá determinar que se façam as adequações necessárias do pedido, se o autor assim não o tiver requerido anteriormente. Em respeito ao contraditório, o réu poderá aditar, também, a sua defesa na audiência. Alguns tribunais disponibilizam modelos em suas páginas eletrônicas:TJDFT [www.tjdft.jus.br/cidadaos/juizados-especiais/modelo-de-peticoes], TJSP [www.tjsp.jus.br/PeticionamentoJEC/PeticionamentoJEC/ModelosPeticoes], TJPA [www.tjpa.jus.br/PortalExterno/institucional/Juizados-Especiais/334244-Modelos-de-Peticao-.xhtml]. AgInt no AREsp 735.491/DF , Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/02/2017, DJe 20/02/2017 AgInt no REsp 1540423/DF , Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2018, DJe 24/09/2018. AgInt no REsp 1599906/MT , Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 10/10/2017. AgInt nos EDcl no REsp 1314067/PR , Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 14/08/2017. Com a ressalva de que os honorários advocatícios e as custas processuais somente são cobrados em algumas hipóteses previstas na Lei nº 9.099/95. “Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I – os pedidos sejam compatíveis entre si; II – seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento”. PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Op. cit., p. 605. “Art. 326. É lícito formular mais de um pedido em ordem subsidiária, a fim de que o juiz conheça do posterior, quando não acolher o anterior. Parágrafo único. É lícito formular mais de um pedido, alternativamente, para que o juiz acolha um deles”. “Art. 1.062. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência dos juizados especiais”.

10.1.Requisitos da petição inicial (ou pedido)

Uma experiência inovadora de pesquisa jurídica em doutrina, a um clique e em um só lugar.