5.6 O termo de ajustamento de conduta e os crimes ambientais

5.6 O termo de ajustamento de conduta e os crimes ambientais O constituinte foi bastante específico ao indicar no art. 225, § 3.º, do Texto de Regência que as condutas danosas ao meio ambiente podem ensejar uma tripla responsabilização (civil, administrativa e penal). Ademais, o Direito Penal tem importância ímpar na proteção e defesa do meio ambiente, seja sob a ótica da prevenção ou seja sob a visão estritamente repressiva, 1 o que certamente motivou a manutenção da autonomia entre as mencionadas esferas sancionatórias, já anteriormente asseguradas pelo art. 14 da LPNMA. Neste sentido a valiosa lição de Gilberto Passos de Freitas, para quem “a tutela penal do meio ambiente, bem jurídico fundamental e essencial para a vida, inclusive das futuras gerações, se mostra necessária e imprescindível, observando que a tese sustentada pelos defensores do denominado Direito Penal mínimo, no sentido de serem reduzidos ao mínimo os limites do Direito Penal, onde não haveria lugar para a proteção penal de bens coletivos, dentre eles, os delitos ambientais, foi superiormente contestada por Giorgio Marinucci e Emilio Dolcini, para os quais: ‘Se trata, pelo contrário, de delitos caracterizados por uma vitimação de massa; direta ou indiretamente ofendem círculos amplos (...). E quanto a criminalidade ambiental, as agressões grandes ou pequenas à integridade do ar, da água, do solo etc., minam as condições de sobrevivência, física e econômica, de grupos mais ou menos amplos de pessoas ou de todo o gênero humano’”. E concluiu o citado autor que, “em face do nível a que o meio ambiente foi elevado pela Constituição brasileira de 1988, não há como se discutir a respeito de que ela tornou legítima a criminalização das condutas que o agridam ou que atentem contra ele”. 2 Não obstante a absoluta estanqueidade entre as esferas de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, alguns aplicadores do Direito passaram a sustentar que, ao firmar o compromisso de ajustamento de conduta, faltaria ao Ministério Público justa causa para a persecução penal, devendo o procedimento administrativo (inquérito policial ou termo circunstanciado) ou a ação penal já intentada serem objeto de trancamento, sendo que a via que tem sido mais utilizada é a do habeas corpus. O termo de ajustamento de conduta serviria, portanto, como causa supralegal de exclusão da ilicitude, fora do estrito rol do art. 23 do Código Penal. Este posicionamento ainda é tímido na jurisprudência, havendo um número reduzido de julgados neste sentido, como em emblemático acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, onde o fundamento para a concessão do writ constitucional foi justamente o de que já tendo o dano ambiental sido objeto de ajustamento de conduta, e não havendo notícia de que estejam as cláusulas do instrumento sendo descumpridas, não há razão para se invocar o Direito Penal, que deve ter uma intervenção mínima. 3 Aos que sustentam a existência desta causa supralegal da exclusão da ilicitude, portanto, basta que seja firmado o ajuste e já desaparecerá a justa causa necessária à ação penal. E o Tribunal Mineiro capitaneia este posicionamento, que é quase uníssono nesta Corte, não obstante outros Tribunais, em decisões mais isoladas, também tenham aderido à tese. 4 O Colendo Superior Tribunal de Justiça, entretanto, já se pronunciou no sentido de que, mesmo havendo comprovação de cumprimento do termo de ajustamento de conduta, não se configurará a falta de justa causa se o compromissário dá continuidade dos atos criminosos. 5 Posicionamento intermediário é sustentado por Gilberto Passos de Freitas, que propõe que “das modalidades de acordo previstas no nosso ordenamento jurídico, deve ser dado destaque ao ‘Compromisso de Ajustamento de Conduta’ previsto no art. 5.º, § 6.º, da Lei 7.347, de 24.07.1985. A utilização deste instrumento trará inúmeros benefícios ao meio ambiente e, consequentemente, para a coletividade. Objetivando fortalecer a preservação do meio ambiente, a reparação do dano ambiental antes do recebimento da denúncia, poderá ser reconhecida como causa de extinção de punibilidade, a exemplo do que já ocorre com o crime de peculato culposo, apropriação previdenciária e crimes contra a ordem tributária”. 6 É preciso destacar que a citada posição intermediária impõe, para que haja a extinção da punibilidade, que tenha havido a efetiva reparação do dano antes do oferecimento da denúncia. Não basta, portanto, firmar o ajustamento de conduta, devendo ser verificado que o dano já se encontra devidamente recomposto, sob pena dos agentes degradadores buscarem o compromisso de ajustamento de conduta apenas como meio de se livrar da persecução penal, e, com a extinção da punibilidade, já poderiam inadimplir, pois não haveria como reverter esta decisão. Continuamos, no entanto, nos posicionando dentre aqueles que sustentam a completa autonomia entre as esferas de responsabilidade ambiental, e observamos que o legislador, ao determinar na Lei de Crimes Ambientais que a reparação do dano ambiental é pressuposto para a obtenção da transação penal (art. 27) e para a suspensão condicional do processo (art. 28), já demonstrou sua intenção de não fundir os âmbitos de responsabilização. E não tem sido outro o posicionamento da Corte Superior de Justiça e de outros Tribunais de Segunda Instância, relativamente ao trancamento de ações penais, quando o argumento esteja lastreado no fato do réu ter firmado compromisso de ajustamento de conduta. 7 Portanto, o pedido de trancamento da ação penal só admite acolhimento nas estreitas hipóteses de plena e imediata comprovação da incidência de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria ou prova da materialidade delitiva, o que não é possível ocorrer pelo simples fato de se ter formalizado um compromisso de ajustamento de conduta. Cf. item 8.3. Ilícito penal ambiental e reparação do dano, p. 109-110. TJMG, MS 1.0000.03.400377-2/00, 3.ª Câm. Crim., j. 25.06.2004, rel. Des. Jane Silva. TJMG, MS 1.0000.09.492661-5, j. 18.08.2009, rel. Min. Alexandre Victor de Carvalho; HC 1.0000.09.494459-2, j. 25.06.2009, rel. Des. Jane Silva; MS 1.0000.09.500521-1/000, j.29.09.2009, rel. Des. Antônio Carlos Cruvinel. TRF 1.ª Reg., RHC 2004.37.00.006755-9/MA, j. 27.03.2006, rel. Des. Fed. Carlos Olavo. HC 61199/BA , j. 04.10.2007, rel. Min. Jane Silva. Op. cit., p. 220. STJ, RHC 41003, j. 10.12.2013, rel. Min. Jorge Mussi; HC 187842/RS , j. 17.09.2013, rel. Min. Laurita Vaz; REsp 1294980/MG , j. 11.12.2012, rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira; HC 107645/RJ , j. 13.11.2012, rel. Min. Og Fernandes; HC 82911/MG , j. 05.05.2009, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima; HC 88382/SP , j. 11.12.2007, rel. Min. Felix Fischer; RHC 21469/SP, j. 16.10.2007, rel. Min. Jane Silva; TJRS, Ap. Crim. 70027624196, j. 04.06.2009, rel. Des. José Eugênio Tedesco; TJSC, HC 2009.066621-4, j. 29.01.2010, rel. Des. Alexandre d’Ivanenko; TRF 1.ª Reg., APN 0012202-68.2005.4.01.0000/PI , j. 10.02.2010, rel. Des. Fed. Tourinho Neto; HC 2008.01.00.046311-0/MT, j. 03.11.2008, rel. Des. Fed. Hilton Queiroz; ACR 1999.38.03.003403-6/MG, j. 12.04.2005, rel. Des. Hilton Queiroz; HC 2004.01.00.037367-3/MT, j. 16.12.2004, rel. Des. Hilton Queiroz; TRF 3.ª Reg., SER 2004.61.23.001631-0/SP, j. 16.11.2009, rel. Des. Fed. Peixoto Júnior; TRF 4.ª Reg., SER 2004.70.04.004129-0/PR, j. 09.02.2010, rel. Des. Fed. Tadaaqui Hirose.

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