Capítulo 26 - Os efeitos da corrupção na gestão pública - Considerações Sobre a Lei Anticorrupção das Pessoas Jurídicas

Capítulo 26- Os efeitos da corrupção na gestão pública Na promiscuidade delituosa (concurso) das pessoas jurídicas e dos agentes públicos em todos os níveis se encontra a origem e a explicação da péssima gestão pública no Brasil, onde os investimentos governamentais não se completam e quando raramente isso ocorre, sempre com enorme atraso. Acrescente-se a péssima qualidade das obras, dos equipamentos e materiais fornecidos e da prestação dos serviços por parte das pessoas jurídicas ao Poder Público. A prática da corrupção se dá, outrossim, nos capítulos das medições de obras e certificação de serviços, considerados realizados quando ainda não o foram, ou mesmo nunca o serão. Essa prática é perversa, pois as empreiteiras e os fornecedoras corrompem os escalões médios da administração pública, direta e indireta, levando os engenheiros e os técnicos certificadores a dedicarem toda a sua carreira ao crime da corrupção. O mesmo se diga dos fiscais de obras e de serviços de recolhimento de impostos que extorquem, promovem ou aceitam a prática de sonegação de tributos e de irregularidades, em autorizações de obras afetando neste último caso o tecido urbano de maneira indelével. Não se deve esquecer, a propósito, do dano social que advém da utilização de repasses de verbas da União para os Estados e Municípios que são apropriados pelas empresas privadas envolvidas, sem nenhuma fiscalização do Poder Central que, por falta de organização e de quadros habilitados, fiscaliza a alocação de tais recursos pelo simbólico método da amostragem, mediante sorteio. O desperdício fruto da ausência de fiscalização efetiva e pontual é absoluto, permanente e devastador para o Estado e para a coletividade. O mesmo se pode dizer das alocações das verbas oriundas das emendas do orçamento, obtidas pelos parlamentares e que são destinadas à realização de obras e à prestação de serviços sem uma fiscalização efetiva. Os desvios e, por sua vez a inutilidade da aplicação de tais recursos são evidentes. Por outro lado, também é sistêmica a corrupção decorrente da direcionada contratação de empresas de consultoria e de assessoria a quem as autoridades centralizadas e descentralizadas, inclusive as assim denominadas agências independentes (Agência Nacional de Energia Elétrica, Agência Nacional de Aviação Civil etc.), atribuem a feitura dos editais de credenciamento, de concessão de serviços e de concorrências e, sobretudo, os respectivos cálculos de custos, sempre fraudados e direcionados.. Essas agências de consultorias, de livre escolha e conveniência dos governantes de ocasião, formulam tais instrumentos a fim de favorecer determinadas empresas, cartelizadas ou hegemônicas, num simulacro grotesco, causando enorme e permanente prejuízo ao Estado, notadamente no setor das concessões de longo prazo nas atividades de logística, (portos), energia elé trica (geração e distribuição), combustíveis, estradas, etc. Essas nefastas empresas de consultoria, assessoria e de planejamento, todas do setor privado, passam a exercer funções típicas da administração pública. Além de “planejarem”, essas empresas privadas também exercem as função de fiscalizar obras, serviços e fornecimentos, num evidente conflito de interesses. A atuação delas reforça e instrumentaliza os canais de corrupção pessoa jurídica-governo. Aqui deve ser reiterado que o domínio político das pessoas jurídicas corruptas no seio da administração pública brasileira não se confunde com o mero clientelismo, que é uma modalidade já ultrapassada. Atualmente, nas relações governo-pessoas jurídicas, estas criam uma verdadeira “governança corruptiva” visando cooptar os poderes públicos de forma hegemônica e permanente. E voltando à privatização do setor público via empresas de consultoria estas permitem que diferentes empreiteiras contratem, para a execução de um mesmo tipo de obra ou serviço, sob idênticas condições, com uma variação de preços entre 52% e 2.537%, em termos reais. E, não bastando, os preços cobrados por uma mesma empreiteira, para diferentes contratos de execução de um mesmo tipo de obra ou serviço, em idênticas condições, podem variar de 31% a 1.172% em termos reais 1 . Por outro lado, pseudoempresas de consultoria se prestam a receber, sob o falso pretexto de prestação de serviços, o percentual das comissões que os agentes públicos ajustam com as pessoas jurídicas contratantes com o setor público, aí compreendidas as empresas estatais. Assim, se o contrato administrativo é de 100. A pessoa jurídica contratada paga para as pseudoempresas de consultoria criadas pelos agentes corruptos um percentual, de, v.g., l0% desse valor. Esse método de corrupção permite que o delito seja perpetrado através de fraude, ou seja, dentro de uma pretensa formalidade e legalidade, que, no entanto, se fragiliza à primeira indagação. A rede de corrupção empresarial, ademais, se faz através do pagamento das propinas em offshores. Utilizam as pessoas jurídicas corruptas, para tanto, fundos e reservas que mantêm em sucursais fora do País. Com tais recursos constituem holdings nesses paraísos fiscais transferindo, em seguida, a propriedade das suas ações ao portador aos agentes políticos-administrativos e judiciários corruptos. Os métodos de corrupção acima descritos, muito utilizados na promiscuidade pessoa jurídica-governo, não devem ser imaginados como exaustivos. São inúmeras as modalidades dessa prática deletéria. Todas elas, no entanto, são instrumentos do domínio político que as grandes empreiteiras e fornecedoras exercem junto ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo. Essas práticas “beneficiam” também as empresas médias e mesmo pequenas no seu relacionamento delituoso com os governos, em face do caráter sistêmico da corrupção, que devasta a gestão pública no país.

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