Capítulo 28 - A corrupção no mundo globalizado - Considerações Sobre a Lei Anticorrupção das Pessoas Jurídicas

Capítulo 28- A corrupção no mundo globalizado Não cabe mais falar apenas em corrupção como fenômeno nacional que, portanto, pudesse ser analisado e dimensiona do em cada país, sem levar em conta a globalização das economias e, nela, a prevalência das multinacionais. Temos, assim, que o grau de incidência da corrupção em determinado país é enormemente influenciado e mesmo determinado pela conduta das multinacionais que ali operam. Mais do que isso, é fundamental lembrar que as multinacionais corrompem de maneira e intensidade diversas conforme cada país, dependendo do grau de delituosidade dos respectivos políticos e agentes públicos. Assim, uma mesma multinacional conduz-se dentro das regras éticas em um determinado país e, ao mesmo tempo, age de maneira delituosa em outro, corrompendo suas autoridades e seus funcionários, fraudando licitações, cartelizando-se e contribuindo, dessa forma, para a criação e a manutenção de um regime administrativo, legislativo e judiciário moldado pela corrupção, como é o caso, sobretudo, de países da África, da Ásia, da Europa Central e da América Latina. Essas multinacionais operam licitamente, v.g. no seio da União Europeia e da Europa Ocidental, que ostentam os menores índices de corrupção no Mundo (23%), ao passo que corrompem as autoridades dos demais países da América Latina (66%), da Ásia (64%), da Europa Oriental, da Ásia Central (95%), do Oriente Médio, do Norte da África (84%) e da África Subsaariana (90%). Desse modo, exemplificativamente, multinacionais canadenses, com um índice pequeno de corrupção (Nota 81 numa escala de 0 a 100) ou a alemãs (78) ou a francesas (71) operam com probidade no interior desses países, o que não fazem nos países identificados como corruptos, em que desenvolvem um relacionamento, ab initio, vicioso com o Poder Público, para fraudar, em concurso com os funcionários locais, as licitações e os contratos administrativos aí celebrados, como se pode ver, em nosso país, com a conduta das empresas Alston (francesa) e Siemens (alemã). Temos, assim, que a globalização econômica, como fenômeno inelutável, traz em si também o crime global da corrupção e de seus subprodutos específicos: a lavagem de dinheiro e a alocação dos produtos da corrupção nas offshores. Daí a preocupação das entidades internacionais no sentido de combater, extraterritorialmente, a prática da corrupção. Existem preciosos estudos que se fizeram e se fazem no plano institucional sobre a extraterritorialidade dessa prática criminosa no mundo todo, de que resultaram importantes tratados mundiais e regionais, visando ao combate universal da corrupção praticada pelas empresas multinacionais 1 . Com efeito, esses estudos e tratados, consideram desde logo e fundamentalmente o caráter mundial da corrupção praticada pelas multinacionais no interior de países onde atuam, sempre em graus diferentes conforme a receptividade e a “tradição” dos governantes de cada um deles na prática da corrupção; em muitos países já “institucionalizada”, como é o caso brasileiro. Nessas nações, em que se inclui a nossa, governar é apropriar-se dos recursos públicos para proveito próprio e o dos partidos políticos no poder. Os governantes e os agentes político-administrativos dos países corruptos – 123 em 175 nações – que administram esses recursos do Estado, concentram suas atividades funcionais na prática do abuso de poder, desvio de poder e desvio de finalidade em proveito pessoal, em termos de comissões, propinas, mordomias, privilégios, para si e para o seu círculo político e familiar que participam de tais atividades criminosas. Nesses países corruptos – em que o Brasil se localiza na 72a colocação – cria-se uma incontável lista de expedientes corruptivos, como o de interposição de pessoas e a constituição de uma legião de empresas fictícias para a execução e a receptação dos produtos advindos desses crimes contra o Poder Público. Para a manutenção desse regime de corrupção sistêmica contribuem as multinacionais não somente no plano do fornecimento de equipamentos, mas também nas concorrências para a prestação de serviços e de obras. Trata-se de conduta detectada já há mais de meio século, quando da venda de aviões à Holanda pela empresa Lockheed, em que se revelou o sistema de briberies praticado pelas multinacionais, ao conseguir subornar os governantes, a partir do Príncipe Consorte, para obtenção da preferência na compra dos mesmos. Não obstante, a origem criminosa de tais recursos pagos às autoridades corruptas dos países estrangeiros eram eles contabilizados como despesas na matriz contábil da multinacional, constando do seu balanço consolidado. Tal ocorria, naquela época, nos Estados Únicos e até recentemente, na França e na Inglaterra. Essa forma de colonialismo econômico criminoso praticado pelas multinacionais mereceu a reação internacional, diante dos estudos que mostram o dano civilizatório que tais práticas acarretam aos países alvos das multinacionais corruptoras, afetando seu desenvolvimento político, social e econômico. E quando tais práticas criam, não obstante, riquezas estas são apropriadas inteiramente pelos detentores do poder nesses países corruptos.

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