Capítulo 40 - Solução através da cooperação internacional - Considerações Sobre a Lei Anticorrupção das Pessoas Jurídicas

Capítulo 40- Solução através da cooperação internacional É claro que o aumento da repressão extraterritorial e da aplicação ultraterritorial das leis auxilia no cumprimento dos compromissos internacionais anticorrupção assumidos pelo Brasil perante a OCDE, a ONU e a OEA. Com efeito, pressionar as pessoas jurídicas fora do alcance territorial brasileiro reduz a vantagem econômica ilicitamente obtida por elas e por seus Estados com o não cumprimento eficaz de suas próprias leis anticorrupção. No entanto, existem valores que devem prevalecer sobre esse legítimo interesse de dar cumprimento a compromissos internacionais anticorrupção. Acima de tudo, deve-se proteger a soberania estatal, manifestada através do poder de império e da competência territorial, isto é, da autoridade exclusiva de regular o comportamento das pessoas dentro de seu território. Nessa linha, um Estado pode aplicar sua Lei sobre três tipos de condutas, (i) aquelas que ocorrem dentro de seu território, (ii) aquelas de seus nacionais e (iii) aquelas externas que geram impacto efetivo sobre seu território. Mas essa aplicação deve, ainda, preencher uma série de requisitos rígidos, a exemplo do que prevê o referido artigo 7º, § 2º, do Código Penal brasileiro. Qualquer aplicação do Direito interno a fatos que não se enquadrem nessas circunstâncias deve ser considerada uma violação do Direito Internacional. Ademais, a aplicação unilateral de critérios diversos para determinação dos limites da jurisdição pode acarretar conflitos positivos de jurisdição. Por exemplo, uma pessoa jurídica é absolvida de corrupção no seu Estado, pela aplicação do critério territorial ou pelo nacional, e é condenada em outro Estado conforme a doutrina dos efeitos. Pode ocorrer, ainda, que um Estado que absolveu uma pessoa jurídica de práticas de corrupção muito provavelmente não executará uma decisão estrangeira que condena a mesma rática. É claro, que o Brasil poderá punir essa pessoa jurídica através dos ativos de suas filiais e de seus representantes. Mas seria limitada sua capacidade de punição. Ocorre que nenhuma limitação está prevista na presente Lei. Vale lembrar que a presente Lei prevê a responsabilidade tanto administrativa como civil. Se no Direito Internacional Privado somente um Estado pode exercer jurisdição, excluindo-se os demais, no âmbito administrativo não há tal limitação, podendo ocorrer concorrência de processos penais-administrativos ou sancionatórios em diferentes países. De qualquer forma, se a ré foi absolvida administrativamente no Estado onde o ato corruptivo foi praticado, entende-se que o Brasil – em respeito à jurisdição estrangeira e dispondo, geralmente, de menos elementos probatórios que a jurisdição original – não poderá puni-lo administrativamente. E, na ausência de punição penal-administrativa não podem ocorrer os efeitos civis de responsabilização da pessoa jurídica imputada. Do mesmo modo, e como reiterado, aquele que for condenado no exterior e lá tiver cumprido totalmente sua pena, não poderá ser processado novamente em solo brasileiro pelos mesmos fatos, em conformidade com a garantia do non bis in idem, prevista nos artigos 8º e 42 do Código Penal. Em síntese, os requisitos da ultraterritorialidade condicionada, dispostos no referido artigo 7º, § 2º, do Código Penal, deverão ser preenchidos total e cumulativamente. Isto posto, verifica-se que a solução para o combate à corrupção não parece estar no unilateralismo, mas no respeito das soberanias estrangeiras, mediante a progressiva harmonização das legislações e na celebração de tratados vinculantes (não meras diretrizes) que incentivem a colaboração das autoridades administrativas correcionais e judiciais. Em conclusão, embora a presente Lei deva ser festejada pelo seu intento de punir administrativamente (jus puniendi) e via de consequência responsabilizar civilmente as condutas corruptivas das pessoas jurídicas dentro ou fora do território brasileiro, a eficácia de sua aplicação e sua conformidade com o Direito Internacional dependem, necessariamente, de uma interpretação administrativa e judicial que imponham requisitos que garantam o respeito à soberania dos Estados estrangeiros, a exemplo do que dispõe o referido art. 7º, § 2º do Código Penal brasileiro.

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