Capítulo 63 - Os cartéis como tipo de fraude concorrencial - Letra "a" do inciso IV do art 5º - Considerações Sobre a Lei Anticorrupção das Pessoas Jurídicas

Capítulo 63- Os cartéis como tipo de fraude concorrencial - Letra a do inciso IV do art. 5º O cartel, como uma das modalidades tipificadas na letra a do inciso IV do art. 5º, estabelece a fixação de preços e a divisão de obras e de fornecimentos nas concorrências e leilões públicos envolvendo as pessoas jurídicas que deles podem participar para, assim, partilhar os contratos celebrados com o Poder Público por valor mais vantajoso do que aquele que seria contratado em decorrência de uma licitação regular. Caracteriza-se como um cartel de quotas. Trata-se de uma societas sceleris entre pessoas jurídicas que deveriam concorrer entre si e que, no entanto, estabelecem um concurso delitivo para fraudar o Poder Público. Conceitua-se o cartel para o efeito da presente Lei como a prática concertada entre concorrentes em licitações e leilões públicos, mediante a combinação quanto ao conteúdo da proposta de cada uma delas para, assim, dividir os serviços, as obras e os fornecimentos para o Poder Público. São ajustes informais de caráter consorcial, visando dividir entre os seus integrantes, os contratos firmados com o Poder Público 1 . São esses cartéis, pactos delitivos entre pessoas jurídicas que participam ilicitamente das licitações e adjudicam contratos partilhados entre elas. É forma delituosa de restringir os direitos legítimos de participação dos concorrentes em licitações públicas e, consequentemente, na adjudicação de contratos administrativos, como referido. Trata-se o cartel de uma comunhão delituosa de interesses organizada sob a forma de associação informal visando propiciar vantagens econômicas a seus participantes em detrimento dos interesses do Estado. O objetivo do cartel de quotas é de ilicitamente aumentar os lucros e as vantagens auferidas dos contratos que celebra com o Poder Público. Trata-se de um consortium sceleris que integra pessoas jurídicas no intuito de obtenção de lucros que não seriam obtidos se na licitação e nos contratos administrativos não tivessem previamente repartido entre os seus integrantes, ilicitamente, os fornecimentos, as obras, os serviços, as concessões e as permissões. Desse modo, o cartel no seio do Poder Público se caracteriza por uma divisão dos contratos adjudicados, do que resulta cada uma das pessoas jurídicas concertadas se beneficiar dos preços e das condições contratuais fraudando o regime de licitação e, portanto, de concorrência que é a finalidade desse fundamental procedimento administrativo. As pessoas jurídicas cartelizadas, ao invés de concorrerem, dividem o “mercado” entre elas, cada uma adjudicando um pedaço do contrato administrativo. Esse concurso delituoso das pessoas jurídicas afasta os concorrentes e permite a cobrança de valores exorbitantes do Poder Público, que seriam completamente outros se prevalecesse a livre concorrência nos certames. Essa sofisticada prática delituosa requisita, de um lado, o concurso de duas ou mais pessoas jurídicas que entre si dividem o contrato administrativo e, de outro, a participação do agente público encarregado de formular e de administrar o certame. Trata-se de modalidade diversa daquela de concurso delituoso, em que apenas uma dentre as pessoas jurídicas concorrentes adjudica o contrato administrativo, num sistema delituoso de rodízio. Caso clássico de cartel de quotas formado contra o Poder Público é o estabelecido entre a Alston e a Siemens no que respeita ao fornecimento de equipamentos para o Governo do Estado de São Paulo. De se notar nessa mauvaise entente o seu carater transacional de que trata a presente Lei, caracterizado pela ilícita comunhão de interesses entre competidores de dois países – França e Alemanha, tendo por objeto o “mercado” brasileiro no campo da administração pública. Trata-se, no caso Alstom / Siemens, de um cartel de quotas ou de contingenciamento ao promoverem entre elas a partição dos fornecimentos dos equipamentos ao Poder Público estadual, mediante manipulação dos certames e dos contratos administrativos, com o indispensável concurso dos agentes públicos encarregados. Assim as duas multinacionais (Alston e Siemens) estabeleceram um ajuste delituoso que lhes conferiu um ilícito poder econômico, estrutural (consórcio informal) e estratégico (partição de contratos de fornecimento ao Poder Público), típico de atividade monopolística para, com o concurso dos agentes públicos, impor seus preços e suas condições e, assim, suprimir os direitos concorrenciais das demais pessoas jurídicas interessadas no certame. Obtiveram, desse modo delituoso as duas multinacionais um preço-lucro monopolístico e arbitrário, atingível apenas através da cartelização desses fornecimentos à administração pública, mediante o frontal desvio da finalidade da concorrência pública respectiva e dos contratos administrativos que se seguiram. O dano ao Estado nessa espécie de delito objetivo de cartel de quotas é duplo: supressão da concorrência nos certames públicos e elevação dos preços pagos pelo Poder Público às pessoas jurídicas cartelizadas.

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