Capítulo 73 - Princípios da administração pública vinculantes da conduta - Art. 5º, caput - Considerações Sobre a Lei Anticorrupção das Pessoas Jurídicas

Capítulo 73- Princípios da administração pública vinculantes da conduta - Art. 5º, caput A presente Lei tem por finalidade punir a pessoa jurídica por conduta corruptiva no seio do Estado 1 . A proposição normativa é clara. As pessoas jurídicas enunciadas no art. 1º, que têm interesses junto ao Poder Público, estão, nessa específica qualidade, vinculadas aos princípios jurídicos que regem a administração. Desse modo, todo o relacionamento das pessoas jurídicas com os entes públicos e seus agentes, de natureza legal (tributos) ou contratual, deve rigorosamente observar os princípios que regem o exercício da função pública. O pressuposto é que essas relações (legais e contratuais) devem se revestir de inconteste legalidade e legitimidade, não podendo resultar do tráfico de influência ou de oferecimento de vantagem de qualquer tipo a agente público. Reitere-se que a pessoa jurídica que se relaciona de forma permanente ou episódica com o Poder Público, em virtude de obrigações legais ou contratuais, está vinculada aos princípios jurídicos que regem a gestão pública. O fundamento é que a pessoa jurídica não pode agir e se relacionar com o Poder Público a não ser na estrita conformidade com tais princípios. E o requisito dessa vinculação da pessoa jurídica aos princípios jurídicos fundamentais do Poder Público, é de que sua conduta seja regular e, portanto, lícita. Essa conduta será presumivelmente ilícita mesmo quando o benefício não seja desde logo concreto e atual como no caso de prometer ou dar vantagem indevida ao agente público, com funções e atribuições políticas, administrativas, legislativas ou judiciárias (inciso I do art. 5º). Com efeito, a conduta delitiva da pessoa jurídica não visa, sempre, a obtenção de um benefício dado, mas sim uma expectativa de benefício ilícito (art. 5º, incisos I, II, III, IV). Trata-se de quebra de dever da pessoa jurídica no seu relacionamento com o Poder Público, que impede a realização de seu precípuo encargo de atender ao interesse público primário, aquele da coletividade. A corrupção praticada pela pessoa jurídica em concurso com o agente público tem como efeito a quebra da imagem e do respeito do Estado junto aos seus jurisdicionados e à comunidade internacional. Essa é a razão maior da presente Lei: – punir aquelas pessoas jurídicas que têm deveres legais e interesses de natureza mercantil ou social junto ao Poder Público e que, em concurso com agente público, infringem os princípios jurídicos que regem a atividade do Estado. A presente Lei tem por finalidade precípua punir (jus puniendi) administrativamente (Capítulo IV) a relação delituosa entre o agente público e determinada pessoa jurídica em benefício desta última. O dano decorrente do delito de corrupção praticada pela pessoa jurídica em concurso com agentes públicos, fere os princípios que se impõem à gestão do Estado. Tais princípios fundamentam as sanções decorrentes de conduta corruptiva da pessoa jurídica em concerto com agente público. Por isso, os princípios constitucionais e gerais invocados no caput do art. 5º da presente Lei devem ser entendidos como próprios do Direito Público e não apenas do Direito Administrativo . E, assim, estão submetidas rigorosamente a tais princípios, a par de todos os entes e servidores dos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e das três instâncias federativas (União, Estados e Municípios), também as pessoas jurídicas que têm deveres legais e os que visam estabelecer, ou já estabeleceram, vínculos contratuais, conveniais ou de subsídio com o Poder Público para lhe prestar colaboração no exercício de suas funções, visando o interesse coletivo. E não somente o princípio da moralidade administrativa é lesado pela conduta corruptiva da pessoa jurídica, de que fala o caput do art. 5º. A conduta corruptiva da pessoa jurídica afeta o princípio fundamental da legalidade que rege a atuação do Estado em todas as suas atribuições e funções. E a conduta delituosa da pessoa jurídica fere, concomitantemente, a finalidade pública dos atos praticados pelo Estado que passam a ser desviados para o benefício ilícito de um interesse privado. Neste caso ocorre um desvio de finalidade originado de um abuso de poder ocasionando um grave desequilíbrio no que respeita aos direitos dos administrados – coletivos ou individuais – e o exercício das atividades próprias do Poder Público 2 . Fere-se, desse modo, o referido princípio fundamental da legalidade dos atos administrativos (os de estrita legalidade e os discricionários) em que deve prevalecer o interesse público sobre o interesse privado Os princípios da administração do Estado a que refere a presente Lei em seu artigo 5º, caput, remete àqueles explicitamente instituídos na Constituição de 1988, em seu art. 37 e que são os da legalidade e da moralidade administrativa, bem como o da impessoalidade, da publicidade e da eficiência. A esses princípios constitucionais acrescentam-se aqueles positivados na legislação ordinária, como os inscritos da Lei do Processo Administrativo Federal (Lei n 9.784 de 1999) e que são os da finalidade, da motivação, da razoabilidade, da proporcionalidade, da ampla defesa, do contraditório, da segurança jurídica e do interesse público, além de, naquele mesmo Diploma, reafirmar-se os princípios constitucionais da legalidade, da moralidade e da eficiência. A tais princípios agregam-se os específicos inscritos na célebre Lei n. 8.666 de 1993 sobre licitação e contratos administrativos e sobre o regime de concessão e permissão de serviço público (Lei n. 8.987 de 1995), como o de equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos. (letra g do inciso IV da presente Lei). Acrescente-se, ainda, o princípio constitucional do controle da administração pública pelo Poder Judiciário que constitui necessariamente a instância que se coloca acima daquele da auto execução consubstanciada no processo penal-administrativo de que trata o Capítulo V da presente Lei. E, assim, para os efeitos da presente Lei, notadamente no que respeita à tipificação objetiva instituída no seu art. 5º, os princípios que comandam o Direito Público não são apenas os inscritos na Constituição e nas leis, mas, também os princípios gerais ínsitos ao Estado Democrático de Direito. Estes devem ser absolutamente observados na relação que se estabelece entre o agente público, de um lado, e a pessoa jurídica no plano de seus deveres legais e interesses contratuais junto ao Poder Público. Assim, são impositivos às pessoas jurídicas em sua relação com o Poder Público os cinco princípios inscritos na Constituição (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência) e todas as demais, como o da supremacia do interesse público sobre o interesse privado e o da finalidade.

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