Capítulo 130 - Danos morais causados ao Estado - Considerações Sobre a Lei Anticorrupção das Pessoas Jurídicas

Capítulo 130- Danos morais causados ao Estado Muito se estudou no Direito brasileiro sobre o dano moral causado à pessoa jurídica. 1 Não se discute, pois, a admissibilidade do dano moral sofrido pela pessoa jurídica e seu ressarcimento judicial. Trata-se de matéria consagrada pela Jurisprudência e pela Doutrina. O que se deve indagar é se o Estado, como um ser político-administrativo, pode ser ressarcido por dano moral, tal como o são as pessoas jurídicas de Direito Privado. No contexto da presente Lei a sua admissibilidade está desde logo acolhida no art. 5º ao dispor que “constituem atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas (...) contra os princípios da administração pública (...)”. E dentre esses princípios está o da moralidade administrativa (art. 37 da CF) que, obviamente é afetada no concurso corruptivo constituído entre a pessoa jurídica e os agentes políticos, administrativos ou judiciários. Acrescente-se que o objeto jurídico do processo penal-administrativo é o Poder Público atingido precipuamente em sua moralidade, na qualidade de sujeito passivo do delito corruptivo produzido pelo referido concurso pessoa jurídica-agente público. Trata-se, com efeito, a moralidade de um bem jurídico extrapatrimonial e imprescindível do Estado. Desse modo, o dano que sofre o Estado pela conduta corruptiva da pessoa jurídica em concurso com o agente público atinge objetivamente a sua honra representada pela quebra da moralidade administrativa. E, como reiterado, o objeto jurídico do processo penal-administrativo é exatamente o de punir a pessoa jurídica que delituosamente se consorciou com o agente público na prática corruptiva, atingindo, em consequência, o patrimônio moral do Estado, em termos de credibilidade, respeitabilidade e honorabilidade. Tais valores sociais são absolutamente imprescindíveis para que o Estado possa impor as leis, exercer o seu poder de polícia e proporcionar segurança jurídica aos jurisdicionados. O Estado é atingido em sua honra objetiva, muito além do dano causado pela conduta corruptiva ao seu patrimônio material, ou seja, aos cofres públicos. A propósito Orlando Gomes: “a expressão dano moral deve ser reservada exclusivamente para designar o agravo que não produz qualquer efeito patrimonial” 2 Desse modo, a punição (jus puniendi) decretada no devido processo penal-administrativo tem como efeito tanto o dano material como o dano objetivo à moralidade do Estado, a serem devidamente apurados na ação civil pública. Portanto, o dano moral (extrapatrimonial) sofrido pelo Estado constitui um efeito autônomo, no sentido de que ele sempre existirá independentemente do fato de ter sido apurado na mesma ação civil pública o dano aos cofres públicos, ou seja, o dano material ao Estado. Assim, a punição (jus puniendi) havida no devido processo penal-administrativo atinge sempre o bem jurídico representado pela moralidade estatal ferida pela conduta da pessoa jurídica com concurso do agente público, ainda quando não haja dano aos cofres públicos, como reiterado. E esse dano extrapatrimonial deve ser mensurado pelo juiz dentro do contexto ressarcitório próprio do dano moral, separadamente, portanto, do decreto judicial de ressarcimento aos cofres públicos. E essa condenação civil de reparação moral deve levar em conta a dimensão do dano causado à imagem do Estado perante a coletividade em termos de (i) repercussão, (ii) dimensão e (iii) efeito de duração. São critérios que devem rigorosamente ser levados em conta pelo Juiz. Assim, devem ser pesados na condenação civil – dentro dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no caso concreto – (i) se a repercussão da conduta corruptiva se dá no âmbito do município, do Estado-Membro ou da União (repercussão), (ii) se envolve os agentes políticos, administrativos e judiciários de maior grau hierárquico (dimensão) e (iii) se tende a, pelo tamanho do escândalo, repercutir por longo tempo junto à coletividade e à opinião pública (efeito de duração), como, v.g., os casos do mensalão, da Petrobras, dos anões do orçamento, do impeachment do Collor. Pesados esses efeitos, cabe ao juiz dimensionar o ressarcimento pelo dano moral. A propósito, o saudoso Carlos Alberto Bittar afirma que o ressarcimento pelo dano moral à pessoa jurídica deve ser: “compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se de modo expressivo no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante 3 ” Dentro desses três critérios de ponderação (dimensão, repercussão e efeito de duração) e atendidos os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, inexiste para o juiz um parâmetro mínimo ou máximo para decretar a reparação civil por dano moral causado ao Estado, no caso concreto. Há, objetivamente, uma dignidade do Estado que deve ser ressarcida no plano civil, ou seja, na devida ação civil pública, face ao pressuposto absoluto que deve o Poder Público agir com ética, com moralidade, cuja quebra, por comissão pura ou comissão omissiva da pessoa jurídica, causa danos institucionais nos planos político, administrativo e judiciário. O juiz deve decretar o valor monetário a título de ressarcimento do dano moral sofrido pelo Estado, autonomamente do ressarcimento aos cofres públicos, caso tenha havido dano material apurado, no caso concreto. A conduta corruptiva da pessoa jurídica tem como efeito a quebra da reputação do próprio Estado junto à coletividade, daí decorrendo uma quebra de confiabilidade nos valores de moralidade que devem presidir a conduta do Estado. A moralidade do Poder Público é atingida. Daí ser a moralidade do Estado o precípuo objeto jurídico do devido processo penal-administrativo, cujos efeitos ressarcitórios se operam, em seguida, na ação civil pública, como reiterado. Sobre a matéria os preciosos estudos de Luiz Alberto Thompson Flores Lenz, “Dano Moral Contra a Peoa Jurídica”, in Rev. dos Tribunais, vol 734, dez. 1996, pag. 56 e segs. Jorge Shiuguemitsu Fujita, “Pessoa Jurídica e o Dano Moral”, in Rev. Do Instituto dos Advogados de São Paulo, v. 22, p. 92 e ssss. jul. 2008.

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