7.6 - Estabilização da tutela de urgência antecipada - 7 - Tutelas de Urgência Arbitrais Perante o Poder Judiciário

7.6. Estabilização da tutela de urgência antecipada O Código de Processo Civil de 2015 traz relevante inovação no campo das tutelas de urgência. Segundo o art. 304, a “tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso”. Em seguida, no § 2º do mesmo artigo, há a previsão de que “qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada”, pois, caso assim não o faça, a “tutela antecipada satisfativa conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2º” (CPC/2015, art. 304, § 3º). Trata-se de dispositivo inspirado no sistema no référé francês e belga, por meio do qual a medida provisória conserva os seus efeitos caso não seja seguida por um processo sobre o mérito. 1 Não é objeto deste estudo analisar as vantagens e desvantagens que o novo modelo pode trazer ao processo estatal, mas apenas verificar os impactos que essa alteração pode trazer quando a eventual demanda principal estiver sob a jurisdição dos árbitros. 2 A principal questão aqui apresentada é a possibilidade dessa decisão do juiz esvaziar a competência do tribunal arbitral, caminhando de encontro à vontade inicial das partes de ter a sua relação jurídica de direito material decidida por julgadores privados. Para o demandante, cuja pretensão foi provisoriamente satisfeita, não haveria a necessidade, em princípio, de mover a demanda principal perante os árbitros. O demandado, por sua vez, caso queira reverter a situação que lhe é desfavorável e foi estabilizada, teria o ônus de iniciar demanda na esfera arbitral. Se assim não o fizer no prazo legal de dois anos (art. 304, § 5º), o provimento do juiz será estabilizado e resolverá definitivamente a questão. Diante dessa situação, quando o processo principal for arbitral, poderia entender-se que a tutela de urgência continua a ser tendencialmente provisória, posto que com potencial de se tornar definitiva, e, portanto, a vontade inicial das partes só seria violada se a parte prejudicada pela tutela de urgência arbitral concedida pelo juiz não desse inicio ao processo arbitral no prazo de “dois anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo” (art. 285, § 5º). 3 No entanto, como já mencionado quando se tratou de potencial reconhecimento de prescrição e decadência na demanda antecedente, as cortes estatais só estão autorizadas a analisar o mérito do litígio de forma sumária e provisória. O potencial risco de a decisão do juiz tornar-se definitiva, prejudicando a análise do mérito do litígio pelos árbitros, já é suficiente para afastar os efeitos da estabilização da tutela de urgência satisfativa. Mais importante ainda, a regulamentação da questão na Lei de Arbitragem, por meio do art. 22-A, parágrafo único, parece não deixar dúvida de que o demandante – beneficiado pela tutela de urgência concedida pelo juiz em caráter antecedente – possui a obrigação de “requerer a instituição da arbitragem no prazo de 30 (trinta) dias”, sob pena de cessar a eficácia da medida de urgência. Tratando-se de regra específica sobre o assunto, não há nenhuma dúvida de que esta prevalece sobre eventuais disposições gerais do Código de Processo Civil. Em estudo direcionado ao tema, Talamini ainda apresenta outros argumentos pelos quais as tutelas de urgência arbitrais não são passíveis de estabilização, tais como (i) admitir a estabilização da tutela antecipada implicaria tornar permanente a competência estatal estabelecida como provisória; (ii) o objetivo principal do mecanismo de estabilização da tutela antecipada é a diminuição da carga de trabalho das cortes estatais, não sendo o caso quando as partes escolhem a via arbitral; (iii) a possibilidade de estabilização da tutela de urgência pré-arbitral funcionaria como incentivo impróprio ao uso dessas demandas; (iv) descabimento de forçar a parte a ingressar com recurso quando a tutela de urgência concedida já será passível de revisão pelos árbitros no momento em que estes assumirem sua competência; (v) inversão indevida do ônus de se ingressar com a arbitragem. 4 De fato, todos esses argumentos reforçam o que está claro na Leide Arbitragem: a parte beneficiada pela tutela de urgência antecedente possui o ônus de tomar as medidas necessárias ao início do processo arbitral, sob pena de revogação da medida anteriormente concedida. BONATO, Giovanni. I référés nell’ordinamento francese, p. 35 e ss. Sobre o assunto no processo estatal, cf. TALAMINI, Eduardo. Tutela de urgência no projeto de novo Código de Processo Civil: a estabilização da medida urgente e a “monitorização” do proceo civil brasileiro, p. 13 e ssss.; THEODORO JR., Humberto; ANDRADE, Érico. A autonomização e a estabilização da tutela de urgência no Projeto de CPC, p. 13 e ss.; LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Estabilização da tutela antecipada e julgamento parcial de mérito, p. 1 e ss. Diante do cenário francês que há muito admite a possibilidade de estabilização da medida, Fouchard, Gaillard e Goldman ressaltam os mesmos aspectos abordados acima: “the decision taken by the court is by nature provisional and in no way binds the arbitral or judicial authority with jurisdiction over the merits. The risk of infringing the arbitrators’ jurisdiction is therefore temporary” (cf. Fouchard, Gaillard, Goldman on international commercial arbitration, § 1.340, p. 728). Cf. Arbitragem e a tutela provisória no CPC/15, p. 186 e ss.

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