15.1 Constituição de capital para atender a obrigação alimentar decorrente de ato ilícito

15.1 Constituição de capital para atender a obrigação alimentar decorrente de ato ilícito A matéria é de ordem processual. Preceitua o art. 475Q do CPC, em redação trazida pela Lei 11.232, de 22.12.2005, que revogou o art. 602, que tratava do mesmo assunto: “Quando a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, o juiz, quanto a esta parte, poderá ordenar ao devedor constituição de capital, cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da pensão”. Nas indenizações por morte e incapacidade temporária ou permanente, uma das cominações impostas ao agente é o pagamento de pensão correspondente ao valor mensal que percebia a vítima. Não basta a mera condenação. Importa sobremaneira o cumprimento da obrigação, com o que se preocupou o legislador, dando origem ao dispositivo citado, que rememora a tradição de nosso direito processual civil desde os primeiros códigos. O termo alimentos vem empregado de forma genérica. Lembrava Alcides de Mendonça Lima: “Desde o Código de 1939 que o intuito do legislador – então como novidade no ordenamento processual – foi o de uniformizar o modo de liquidação de obrigações decorrentes de atos ilícitos, conforme o art. 1.537 ao art. 1.540 do CC, envolvendo prestação alimentícia, no sentido amplo, à própria vítima ou a seus dependentes legalmente”. 1 O art. 1.537 referido corresponde ao art. 948 do vigente Código Civil. A constituição de capital, pois, envolve qualquer pensão com o caráter de alimentos e não originada de um dever fundado em direito de família. Escreve, corroborando, Amílcar de Castro: “O art. 602, com a nova redação, que lhe foi dada pela Lei 5.925, de 01.10.1973, referese exclusivamente à prestação de alimentos incluída na indenização por ato ilícito (arts. 1.537, II, e 1.539 do CC). Não compreende os alimentos devidos a título de parentesco, ou com base no direito de família, nem os alimentos provisionais (art. 296 e ss. do CC e art. 732 e ss. deste CPC)”. 2 Esclareçase que os artigos citados – 1.537, II, e 1.539 – do Código anterior equivalem aos arts. 948, II, e 950 do Código ora em vigor; já o art. 296 e ss. não têm correspondência no atual diploma civil. De outro lado, a prestação nasce do ato ilícito, mas não se afasta a garantia se decorre a obrigação da culpa contratual ou da responsabilidade objetiva. Não está circunscrita ao crime de homicídio e ao de lesões corporais graves ou leves, mas a todo ato lesivo, visando a garantia atender à reparação dos prejuízos causados por tais delitos e por outros eventos lesivos, tendo proeminência, no entanto, os cânones dos arts. 948 a 950 (arts. 1.537 a 1.539 do CC antigo). Seja doloso ou culposo o fato, ou decorra da responsabilidade objetiva, interessa a verificação do dano. As prestações vincendas têm aplicação à espécie, ou seja, às que se vencerem no futuro, como orienta a jurisprudência: “A execução de pensão alimentícia vincenda, decorrente de ato ilícito, é procedida de acordo com o art. 602 do CPC”. 3 Em um pronunciamento do STJ: “Nas ações indenizatórias, o objetivo de constituirse um capital é o de dar à parte lesada a segurança de que não seja frustrada quanto ao efetivo recebimento das prestações futuras a que faz jus. Regra aplicável, pois, à relação entre devedor e credor da lide principal”. 4 A quantia devida até a sentença fica subordinada à execução comum, como no caso de qualquer outro valor certo, seguindo os passos da penhora, avaliação e expropriação. Compreende a quantia calculada entre a data da cessação da atividade pela prática do ato ilícito e o dia da sentença condenatória transitada em julgado. Abrange os acessórios, computandose os juros, a correção monetária, as custas e os honorários. O capital a ser formado se relaciona às prestações futuras, num lapso de tempo correspondente à vida provável da vítima, se falecida, ou ao longo de seus dias, se restou incapacitada definitivamente. Tem defendido o Superior Tribunal de Justiça que a constituição deve vir ordenada na sentença proferida em processo de conhecimento: “A condenação prevista no art. 602, caput, do CPC deve constar da sentença proferida no processo de conhecimento, não podendo ser postulada na fase de liquidação ou no processo de execução”. 5 Entrementes, não se encontra regra impondo esse momento. Desde que surjam motivos para exigir a garantia posteriormente, concedese sua instituição. Se em dado momento as circunstâncias não ensejavam a providência, não havia por que buscála. Surgindo uma situação que enseja o colapso financeiro do obrigado, com prenúncios de insolvência, o direito que consolidou a obrigação permite que se estabeleça a garantia. Lembrase que a mera inclusão do credor em folha de pagamento não basta, e nem sempre enseja garantia do cumprimento. Adverte o STJ: “Diante da realidade da economia dos nossos dias, não há razão suficiente para substituir a constituição do capital prevista no art. 602 do CPC pela inclusão em folha de pagamento”. 6 Em outros pronunciamentos: “Ainda que se trate de empresa concessionária de serviço público, é indispensável que seja reconhecida a sua solvabilidade. Caso contrário, não se admite a substituição da constituição de capital, prevista no art. 602, CPC, pela inclusão da vítima em folha de pagamento”. 7 “Em face da realidade econômica do País, que não mais permite supor a estabilidade, longevidade e saúde empresariais, de modo a permitir a dispensa de garantia, a 2.ª Seção deste Tribunal, no julgamento do REsp 302.304/RJ , pacificou posição, afirmando a impossibilidade da substituição da constituição de capital, prevista na lei processual civil, pela inclusão do beneficiário de pensão em folha de pagamento”. 8 Encontramse decisões admitindo a dispensa da providência “quando se trate o devedor de pessoa jurídica de direito público ou pessoa jurídica de direito privado de reconhecida idoneidade”. 9 Tornase a advertir que o art. 602, acima referido, está substituído pelo art. 475-Q, por força da Lei 11.232, de 22.12.2005. Comentários ao Código de Processo Civil, v. 6, t. II, p. 560. Comentários ao Código de Processo Civil, v. 7, p. 110. RT 496/58. STJ, 3.ª Turma, Ag. 274.106 – AgRgEDcl, j. 16.08.2001, DJU 24.09.2001. STJ, 4.ª Turma, REsp 268.666/RJ , j. 05.10.2000, DJU 20.11.2000. STJ, 2.ª Seção, REsp 302.304/RJ , j. 22.05.2002, DJU 22.05.2005, RSTJ 95/315. STJ, 4.ª Turma, REsp 299.690/RJ , j. 13.03.2001, DJU 07.05.2001. STJ, 3.ª Turma, REsp 416.846/SP , j. 05.11.2002, DJU 07.04.2003. 1.º TACSP, 3.ª Câm., Ap. 1.027.9346, Adcoas 8212953, Boletim de Jurisprudência Adcoas, dez. 2002jan. 2003, p. 9.

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