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Como explica Pontes de Miranda:
“(...) habeas corpus eram as palavras iniciais da fórmula do mandado que o tribunal concedia, endereçado a quem tivessem em seu poder, ou guarda, o corpo do detido. A ordem era do teor seguinte, ‘toma (literalmente: tome, no subjuntivo, habeas, de habeo, habere, ter, exibir, tomar, trazer etc.) o corpo deste detido e vem submeter ao Tribunal o homem e o caso’”. 1
Embora o CPP inclua o habeas corpus entre os recursos, predomina o entendimento de que se trata de ação constitucional, que tem por objeto a proteção do direito de liberdade de locomoção. 2
Quanto à sua origem histórica, embora haja referência a medidas do processo romano, como o interdictum de homine liberum exhibendum, seu antecedente histórico mais moderno, com as características mais próximas do instituto na atualidade, é a Magna Carta de 1215 (§ 39).
No Brasil a disciplina do habeas corpus surgiu com o Código de Processo Criminal de 1832 (art. 340). 3
Merece destaque, também, a Lei 2.033, de setembro de 1871, que ampliou o cabimento do habeas corpus, criando a modalidade preventiva do writ. 4
Somente com a proclamação da República é que o habeas corpus ganharia status constitucional. A Constituição de 1891 elevou o habeas corpus à categoria de garantia constitucional. 5
A concessão do habeas corpus poderá gerar tutela meramente declaratória (por exemplo, declara extinta a punibilidade), constitutiva (por exemplo, anula o processo) ou mandamental (por exemplo, ordena a liberdade do paciente ou tranca a ação penal).
Embora seja comum na doutrina a afirmação de que o habeas corpus, na sua modalidade preventiva, confere ao paciente uma tutela cautelar, tal posicionamento é equivocado por confundir tutela cautelar com tutela preventiva. O habeas corpus preventivo, obviamente, confere tutela preventiva, posto que destinada a evitar lesão à liberdade de locomoção. No entanto, trata-se de tutela que satisfaz, definitivamente, a pretensão do paciente. Não é, pois, tutela cautelar, que tem como características a provisoriedade, a instrumentalidade e a cognição sumária. Aliás, seria de indagar: se o habeas corpus preventivo leva à concessão de tutela cautelar, qual seria a tutela jurisdicional principal que essa medida estaria a assegurar?
Outra classificação importante distingue o habeas corpus liberatório, utilizado quando já há lesão à liberdade de locomoção (por exemplo, o paciente já está preso), e o habeas corpus preventivo, utilizado quando o paciente está ameaçado de sofrer restrição ilegal em sua liberdade de locomoção (por exemplo, houve a expedição de um mandado de prisão por juiz incompetente).
Quanto ao habeas corpus preventivo, seu campo de utilização é amplíssimo. Em face do art. 5.º, LXVIII, da CR, que se refere apenas a “achar ameaçado de sofrer violência ou coação”, (destacamos) não foi recepcionado o art. 647 do CPP, que exigia a “iminência” da coação. Assim, é cabível o habeas corpus preventivo mesmo no caso em que a ameaça de prisão constitua apenas um evento possível, no longo prazo, ainda que longínquo ou remoto. Justamente por isso é possível a utilização do habeas corpus em caso de qualquer nulidade processual, mesmo que em uma fase inicial do feito, visto que poderá levar, futuramente, a uma condenação à pena privativa de liberdade ilegal. Trata-se de uma ameaça longínqua de prisão, mas ameaça há e o habeas corpus será cabível.
A situação descrita transformou o habeas corpus em um amplíssimo “agravo” cabível contra toda e qualquer decisão interlocutória proferida em processo penal. E, mesmo nos casos em que há recurso específico, prefere-se o habeas corpus, por ser medida mais eficaz. Na prática, porém, verifica-se um paradoxo. Tal medida, em princípio, parece benéfica, uma vez que amplia a possibilidade de utilização de um mecanismo para proteção da liberdade de locomoção. Todavia, de fato, a liberdade, muitas vezes, acaba sendo prejudicada. O volume de habeas corpus nos tribunais é tão grande que já não se observa uma tramitação prioritária. Não é incomum, em caso até mesmo de habeas corpus liberatório, a demora de meses e meses para o seu julgamento. Em suma, a larga utilização do habeas corpus para prevenir lesões longínquas à liberdade (que muitas vezes, razoavelmente, se estima, somente ocorrerão depois de anos) acaba prejudicando a utilização de habeas corpus para tutelar a liberdade de locomoção em casos em que já existe violação a tal direito. Não é sem razão que o STF já concedeu habeas corpus para determinar que outro habeas corpus em trâmite do STJ fosse julgado em prazo razoável! 6
Concedido o habeas corpus preventivo, o art. 660, § 4.º, do CPP prevê que haverá a expedição de um salvo-conduto ao paciente. 7 Todavia, nem sempre será necessário o salvo-conduto. Em alguns casos, basta que se recolha o mandado de prisão (que foi expedido, mas o paciente não chegou a ser preso), em outros, a simples ordem já é suficiente para retirar a eficácia dos atos processuais (por exemplo, processo perante juiz incompetente) ou pôr fim ao processo (por exemplo, por falta de justa causa para ação penal).
O único caso de vedação legal em abstrato, 8 para a utilização do habeas corpus é para atacar as prisões disciplinares militares, ante a vedação constitucional do art. 142, § 2.º. A razão de ser do não cabimento é a preservação da hierarquia e da disciplina que deve existir dentro das forças armadas. Mesmo assim, só quanto ao mérito ou a injustiça da prisão não é cabível o habeas corpus. 9 De outro lado, tem sido admitido o habeas corpus para atacar a ilegalidade da medida em casos de incompetência da autoridade, 10 a inobservância de formalidades legais, 11 o respeito à ampla defesa, 12 o excesso de prazo da prisão, 13 ou a regularidade formal do procedimento. 14
A vedação também se aplica às polícias militares dos Estados, que, nos termos do art. 144, § 5.º, da CR, são consideradas forças auxiliares e reserva do Exército. 15
Mesmo no estado de sítio é cabível o habeas corpus, dado que sua suspensão não foi prevista no art. 139 da CR. A vedação do habeas corpus para atacar prisão administrativa, prevista no art. 650, § 2.º, do CPP, não tem mais aplicação porque essa modalidade de prisão é incompatível com a nova ordem constitucional.
Em regra, o habeas corpus será cabível sempre que houver lesão ou ameaça à liberdade de locomoção.
Não se admite o habeas corpus por ausência de ameaça à liberdade de locomoção, na hipótese em que somente é prevista pena de multa, que não mais pode ser convertida em pena privativa de liberdade (art. 51 do CP), segundo o entendimento sedimentado na Súmula 693 do STF. 16 Também não é admissível no caso de pena privativa de liberdade já cumprida, nos termos da Súmula 695 do STF. 17 Ainda quanto ao interesse de agir, a Súmula 694 do STF estabelece que “não cabe habeas corpus contra a imposição da pena de exclusão de militar ou de perda de patente ou de função pública”.
Por outro lado, tem-se considerado cabível o habeas corpus no caso em que tenha sido imposta pena restritiva de direitos , pois a liberdade de locomoção poderá ser violada. A possibilidade de conversão das penas restritivas de direitos em privativa de liberdade caracteriza situação de dano potencial à liberdade de locomoção do condenado, sendo cabível a impetração de habeas corpus para sanar eventual constrangimento dela decorrente. Também é cabível o habeas corpus em favor de beneficiado com a suspensão condicional do processo (Lei 9.099/1995, art. 89), porquanto tal medida, por se dar depois do recebimento da denúncia, não afasta a ameaça, ainda que potencial, de sua liberdade de locomoção. 18
Tem sido admitido o habeas corpus quando o paciente está preso em regime de pena mais gravoso que o fixado na sentença condenatória, posto que no regime correto haverá menor restrição à liberdade de locomoção. Já quanto à progressão de regime, prevalecia o entendimento de que o habeas corpus não era adequado para se obter a progressão de regime, tendo em vista que, para tanto, era necessária a análise de requisitos subjetivos, em relação aos quais a limitação probatória do habeas corpus impedia a correta avaliação da matéria. 19 Todavia, com o advento da Lei 10.792/2003, do ponto de vista subjetivo, a única exigência para a progressão de regime é o bom comportamento carcerário, comprovado por certidão do diretor do estabelecimento penitenciário. Assim, desde que haja o cumprimento de …
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